A cetamina, um potente analgésico e agente anestésico, descoberto e sintetizado na década de 60, tem eficácia demonstrada para alívio de quadro dolorosos, em cuidados paliativos e em cuidados intensivos. Nos últimos anos, tal medicação vem recebendo, ainda, olhares importantes na área da psiquiatria devido a sua robusta evidência no tratamento de casos de depressão resistente ao tratamento bem como transtorno de estresse pós-traumático e ideação suicida.
Segundo dados de 2018 da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), a depressão é um transtorno mental frequente que afeta, em todo o mundo, mais de 300 milhões de pessoas, de todas as idades. A doença se dá de forma progressiva e com tendência à recorrência e cronificação. Nesta lógica, estudos mostram que 25% dos pacientes apresentam recaídas nos primeiros 6 meses e 85% recairão em um novo episódio depressivo num período de até 15 anos.
Mesmo com todos os avanços em relação aos tratamento da doença (com diversas classes de antidepressivos), sabe-se que apenas 60 a 70% dos pacientes respondem à terapia tradicional. Sendo assim, até 30% dos casos vão se enquadrar em uma condição chamada de “Depressão Resistente ao Tratamento” (DRT). Tais pacientes costumam evoluir com episódios de depressão mais longos além de uma tendência à utilização de mais medicações e consequente exposição aos seus efeitos adversos.
O conceito de resistência corresponde àqueles quadros onde o paciente não responde adequadamente ao tratamento, ou seja, há ausência de uma resposta satisfatória após o uso de 2 antidepressivos sequenciais administrados em dose efetiva por, no mínimo, seis semanas.
Nestes casos, faz-se necessárias outras alternativas de tratamento, sendo a Cetamina uma potente ferramenta para o tratamento de DRT severa.
Tal medicação tem mostrado grande potencial nas crises graves de depressão tendo um papel importante no que diz respeito à redução da ideação suicida e da anedonia (incapacidade de sentir prazer ou se motivar a realizar atividades que antes eram prazerosas). Mas o uso de tal substancia está indicada apenas para aqueles pacientes com depressão grave sem sintomas psicóticos e como adjuvante ao tratamento com um antidepressivo oral.
CETAMINA E IDEAÇÃO SUICIDA
A cetamina já é validamente usada para tratar episódios depressivos nos amplos transtornos de humor (principalmente depressão e transtorno bipolar), condições frequentemente relacionadas às tentativas de suicídio.
Seus efeitos estão relacionados tanto à ação direta antidepressiva quanto propriamente na diminuição da ideação suicida em um período que varia de horas a dias. Vale lembrar que este início rápido de efeito não é encontrado nos tratamentos tradicionais com fármacos via oral, já que os mesmos costumam necessitar de semanas para início da ação, o que pode torna-los menos eficientes (ou incapazes de obter êxito) no tratamento de um paciente emergencial em franco risco de autoextermínio.
COMO A CETAMINA É USADA
As vias de administração da Cetamina são diversas, porém a única regulamentada para o tratamento nos transtornos psiquiátricos é a forma intravenosa, sendo administrada em doses subanestésicas convencionalmente por 40 minutos (podendo ser aumentado o tempo de infusão para minimizar possíveis efeitos colaterais).
No que tange aos efeitos colaterais, a administração de doses mais altas geram uma maior probabilidade na apresentação, podendo ocorrer: sintomas dissociativos (incluindo desrealização e despersonalização), tonturas, náuseas e vômitos, sedação, vertigem e alterações cardiovasculares (como aumento da pressão arterial e frequência cardíaca).
Para minimizar tais efeitos, tanto dose quanto tempo de administração da medicação são realizados de forma individualizada e sob supervisão médica. Além disso, a recuperação do paciente em um ambiente silencioso, com sensação de segurança, pode reduzir a incidência e gravidade dos sintomas ao despertar após infusão da cetamina.